Opinião: "Brasil: A pior Política Tecnológica de todo o mundo, disparado"


Por Jairo Fonseca* 

Nenhum outro país investe tanto em Tecnologia com resultados tão pífio e na maioria das vezes negativo, que transformou o Brasil num Escravo Tecnológico. É necessário reconhecer a verdade, que nem é tão escondida assim, todos que atuam na área de fomento à Tecnologia sabem que o Brasil ocupa as piores posições em Inovação no mundo, fato comprovado há vários anos.

Curiosamente o Brasil é dos países que mais fomentam Inovação!

Um arcabouço legal monumental, Lei de Informática, Lei do Bem, Lei de Inovação Federal, várias Leis de Inovação Estaduais, uma estrutura governamental também monstruosa: MCTI, FINEP, CNPq, Secretarias de C&T e FAPs Estaduais (Fundações de Apoio a Pesquisa), o Sistema “S” como SEBRAE, CNI, SENAI, SESI que fomentam Inovação em todo território nacional com capilaridade até os municípios, diversos Fundos Setoriais, e, pasmem ... 90 Parques Tecnológicos!

Ainda tem mais ... 400 ICTs Públicos, Institutos de Ciência e Tecnologia, dedicados a Inovação.

imaginem quanto custa esse aparato todo? São sustentados pelo povo, através dos Orçamentos de cada Instituição bem como pelos 15 Fundos Setoriais liderados pelo FNDCT, atendem a todas as áreas: saúde, biotecnologia, agronegócio, petróleo, energia, mineral, aeronáutico, espacial, transporte (terrestre e aquaviário), recursos hídricos, informática e um Fundo destinado ao apoio e melhoria da infraestrutura dos ICTs Púbicos.

Façam as contas apenas para trocar os computadores de 400 ICTs, cada ICT possui quantos computadores, 30, 50, 100? Pois todo mundo tem de ter comutador, da secretária até o Pesquisador mais destacado, multipliquem por 400. Somem os custos de segurança, material de escritório, construção e manutenção do prédio, limpeza ... sem jamais esquecer dos salários desse povo todo, os encargos também, milhares de profissionais.

Será que Israel possui 400 ICTs Públicos dedicados a Inovação? e a Suécia, Suíça, Irlanda, Estônia? Qual outro país possui 400 ICTs Públicos? Percebemos então que não é quantidade de ICTs que gera Inovação, portanto para termos Inovação o foco tem de ser outro, não adianta gastar em nome de uma rubrica.

O Brasil fomenta como país de primeiro mundo, muitos Bilhões de Reais por ano e possui desempenho de terceiro mundo.

Esperamos, nesse artigo, esclarecer e explicar como essa contradição se estabeleceu durante os últimos 30 anos, apertem os cintos vamos voltar no tempo.

Iniciamos nossa jornada em 1991, quando da promulgação da Lei de Informática, o início de todo o mal, inaugurando uma Política Tecnológica diferente, cujos pilares estão ativos e sustentam todos os Marcos Legais de Inovação até hoje.

Importante notar que durante toda a década de 1980 e 1990, o Brasil possuía a segunda maior indústria de TI do mundo, em Hardware e Software.

O Brasil estava 15 anos na frente da China e Coreia!

Podem fazer todas as críticas sobre indústria nacional da época, mas é inegável que o Brasil estava na frente da China e Coreia, durante toda a década de 80 possuía a segunda maior feira de Hardware do mundo, a SUCESU que depois virou Comdex São Paulo, e durante toda a década de 90, o Brasil era palco da maior feira de Software do mundo, a FENASOFT, mais de 20 Sistemas Operacionais Nacionais cada um com mais de 10.000 instalações, todas indústrias e comércio rodavam Sistema Operacional Nacional, até a Urna Eletrônica era Nacional, símbolo de uma era. Outros tantos de Processadores de Texto, Bancos de Dados. Linguagens, Planilhas, Placas de Rede, Modems, etc, tudo Nacional.

Algumas pessoas acusam o Brasil de copiar, primeiro, nem tudo era cópia, mas lembrem-se, o DOS é cópia, todos os Unix e Linux do mundo são cópias, e assim o mundo se move e evolui,

Pois bem, nesse contexto foi lançado uma Política Tecnológica com duas grandes mudanças que se mostraram danosas ao extremo e são as culpadas pelo declínio da Tecnologia Nacional:

·          O Objetivo da Política Tecnológica mudou de verbo, o importante não era mais Criar Tecnologia, mas sim, Usar Tecnologia.

·         Tríplice Hélice da Inovação, incluiu a Academia como terceiro elo de atuação, juntando-se ao já estabelecido Governo e Empresas, os fomentos passam a exigir a execução através de Institutos de Ciência e Tecnologia, principalmente ICTs Públicos ligados as Universidades Pública, que consumem a maior parte dos recursos.

A mudança de objetivo da Política de Usar em vez de Criar Tecnologia destruiu um dos principais pilares da Inovação que é usado por todos os países que se desenvolveram, EBT – Empresa de Base Tecnológica, portanto uma EBT passou a ser aquela empresa que Usa Tecnologia, não a que Cria Tecnologia, assim qualquer empresa de TI, ou até de outra área que faça uso de Tecnologia passa a ser uma EBT, um desastre no Fomento à Inovação, pois ignora quem produz tecnologia e promove quem não cria.

Vamos realizar um experimento mental, aplicar a Teoria dos Jogos, por que um Pesquisador iria Criar Tecnologia? Que é um processo demorado, complicado, difícil, tem muitos concorrentes, quando é muito mais fácil Usar Tecnologia estrangeira, e ganhar a mesma grana. O Pesquisador não será recompensado em nada ao Criar um Computador, ou Sistema Operacional, ou qualquer Tecnologia em geral.

Existe uma anedota que enuncia: O Brasil educava Engenheiros na década de 1980 para Criar Computadores, hoje o Brasil educa Engenheiros para Vender Computadores.

... ainda na Teoria dos Jogos, por outro lado, a motivação fundamental de um Pesquisador Público é Aposentar Pesquisador Público, não tem interesse nenhum em gerar Tecnologia e ter problemas o resto da vida para manter e atualizar essa Tecnologia no estado da arte, muito menos criar um produto com essa Tecnologia, pedir demissão do serviço público, abrir empresa, pagar contador, secretaria, fazer plano de marketing, montar equipes de suporte pré-e-pós-venda, entrar num ciclo comercial de 2 ou 3 anos, Correr Risco e Gerar Riquezas. Não, o Pesquisador Público quer se aposentar Pesquisador Público, sem Correr Risco, ganham suas Bolsas de Pesquisa como bico, algo temporário, quando acabar o projeto, correm atrás de outro Edital, se faltar Recursos, reclamam: a Pesquisa está parando no país.

O tiro pela culatra se manifestou em centenas de instituições públicas que cresceram e multiplicaram, as verbas de fomento a CTI foram e estão sendo usadas para manutenção dessas instituições públicas, não para Criação de Tecnologia ou Inovação.

Esses ICTs Públicos são sustentados pelo povo, as Inovações não resultam e dão prejuízo, o prejuízo é socializado, todos pagam, cada cidadão paga um pouquinho e ninguém percebe que estão pagando sem receber nada em troca, pagam a cada ligação telefônica, a cada conta de energia ou de água, que alimentam os Fundos Setoriais correspondentes, além dos impostos e taxas.

Dessa forma, nenhum ICT Público Gera Riquezas ... apenas aumentam o Custo Brasil, são deficitários, não pagam o investimento, consomem Bilhões de Reais todo ano.

É óbvio que existem exceções, claro ... mas, não podemos justificar uma Política Industrial por exceções que raramente pagam seus próprios projetos, quiçá o sistema inteiro. O que adianta ter Patente e não pagar os custos da Pesquisa e investimento? Patente com ROI negativo.

Mecanismo danoso, as instituições públicas aumentam de tamanho como um Câncer, todos esses ICTs Públicos iniciaram pequeninho, utilizando poucos recursos, hoje, 30 anos depois são prédios grandes cheio de gente e bem equipados.

Por exemplo, recentemente foi anunciado um edital para criação de uma dúzia de Laboratórios de IA - Inteligência Artificial, uma verba pequena apenas para implantação desses Laboratórios, a princípio parece ser uma boa notícia, pois bem ...

·         Esses Laboratórios vão criar tecnologia? Não.

·         Vão, sim, crescer e se multiplicar, contribuir para aumentar o Custo Brasil.

Mas, tudo em nome da Inovação e Tecnologia.

Existem outras questões com a Tríplice Hélice, a Academia e as Empresas são muito diferentes entre si, vejamos:

·         A Academia objetiva gerar conhecimento público, de uso comum, coletivo, enquanto as Empresas desenvolvem conhecimento privado, patenteado, uso restrito.

·         A Academia tem como missão fundamental a Educação, Disseminar Conhecimento, enquanto as Empresas desejam e necessitam Gerar Riquezas, lucro.

Esse conflito de interesses é prejudicial as Empresas e a produção tecnológica. portanto caso exista Tríplice Hélice a Academia Pública tem de servir e ser gerenciada pelas Empresas, caso contrário não acontecerá Geração de Riquezas, muito ao contrário do que realmente acontece, a Academia Pública Brasileira quer mandar nos projetos de CTI para satisfazer seus próprios interesses, pois gerar riquezas privadas não é seu objetivo.

Obviamente muitas falácias foram e ainda são repetidas à exaustão nesses 30 anos, uma delas afirma que não existe Tecnologia sem Pesquisa.

É fundamental ter a percepção que Produção Tecnológica é bem diferente da Produção Acadêmica, na mesma proporção entre Pesquisa Tecnológica e Pesquisa Acadêmica.

A Pesquisa Acadêmica apenas é necessária no limite do conhecimento humano, por exemplo, descobrir ou criar novos materiais ou compostos, princípios ativos, enquanto a Pesquisa Tecnológica trabalha com a conhecimento já estabelecido.

Podemos criar avião, computador, instrumentos, engenhos e mecanismos diversos e complicados, sem nenhuma Pesquisa Acadêmica, enfim qualquer artefato de Engenharia pode ser criado e Patenteado usando-se apenas o conhecimento já assimilado.

Na área de Software, então, a Academia não serve para nada, só atrapalha, podemos criar Sistemas Operacionais, Drivers, Banco de Dados, Geradores de Aplicação, Planilhas, Linguagens, etc, sem nenhuma Pesquisa Acadêmica, simplesmente não é necessária, irá apenas consumir tempo e aumentar os custos do projeto, porém a Política Tecnológica atual apenas fomenta o Software caso tenha a participação da Academia, não sai nada.

Observem o caso do Software, o MCTI criou o CERTICS para estimular a produção nacional, várias empresas investiram 1 a 2 anos para conseguir a certificação, pois bem, o CERTICS nunca foi usado, tempo e dinheiro perdido. Não existe nenhum estímulo a Criação de Software Nacional.

Por que chamam a Lei de Informática se não atende a grande maioria das empresas de Informática, que são de Software? Avaliem em sua cidade quais empresas usam essa Lei. Seria melhor mudar o nome da Lei e deixar de fazer de conta que existe uma Lei de Informática.

Hoje o Brasil não possui Software Básico, já foi a segunda maior potência no mundo e hoje não tem praticamente nada, procurem quais Softwares Básicos Nacionais são usados pelas Instituições Públicas, incluindo Universidades e os próprios ICTs ... zero, em números redondos é zero mesmo (sei que tem exceções, são exceções).

Oicofobia, esse é o melhor nome que achei para designar essa política, aversão a si próprio ... as compras governamentais de TI, algo em torno de 7 Bilhões por ano apenas no nível Federal, o que indica que pode ser até o dobro caso contemos os Estados e Municípios é toda direcionada para Tecnologia Estrangeira:

·         O Brasil implantou uma Reserva de Mercado Invertida, onde o produto Nacional não pode entrar: Oicofobia.

Regularmente ouvimos algumas autoridades, normalmente ligadas a Academia Pública reclamar que falta dinheiro para CTI - Ciência, Tecnologia e Inovação ... isso é absurdo, o câncer exigindo mais sangue.

É difícil saber o real montante dos Fomentos a CTI, porém podemos avaliar por baixo em 15 Bilhões de Reais por ano, basta somar os Orçamentos do MCTI, FINEP, CNPq, FAPs Estaduais, com os 15 Fundos Setoriais, Lei de Informática, Lei do Bem e Lei de Inovação, bem como o investido em Inovação pelo Sistema “S”, CNI, SESI, SENAI, SEBRAE Nacional e Estaduais.

Mas, então, em que é gasto. ou melhor dizendo, desperdiçados esses 15 Bilhões? Consultorias de toda sorte, Capacitações em todas as áreas, Metodologias que curam todos os males, Estudos sem fim nem começo, Gerência de Projetos infinitos ... e, Burocracia, muita Burrocracia, mas nada disso é Tecnologia, nem Inovação!

No Final, trabalham muito e não produzem o que deveriam, a grande maioria das Pesquisas resultam apenas em documentos: papel eletrônico. O argumento de Autoridade Acadêmica, a Tríplice-Hélice cai por terra ao percebermos que Brasília possui a maior quantidade de PhDs do Brasil, o que fazem, Pesquisa?  Não, burocracia apenas burrocracia, tirando as raríssimas exceções.

Para finalizar gostaria de reenfatizar o título desse artigo, o Brasil há 30 anos implantou a pior Política Tecnológica de todo o mundo, disparado. Estávamos 15 anos na frente da China e Coréia e hoje estamos 15 anos atrás, andamos de marcha ré.

Nesse artigo indicamos alguns problemas do Fomento a CTI no Brasil, que transformaram o Brasil num Escravo Tecnológico, noutro artigo podemos identificar as soluções e o rumo à Libertação.

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*Jairo Fonseca - Diretor da Empresa LightBase, do Sindicato SINFOR, das Associações TecSoft e ASSESPRO no DF

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