Na montagem, a escultura do dinamarquês Jens Galschiot, que representa o peso da Justiça sobre os pobres, tendo ao fundo o suntuoso palácio do TJPB |
Por Lenildo Ferreira - Jornalista e advogado
Embora a Paraíba concentre a absoluta maioria dos processos contra a Braiscompany, a maior ação já proposta até agora contra a empresa tramita na Justiça de Minas Gerais. Um milionário de Campina Grande, por meio de advogados de Campina Grande, valeu-se do seu direito (por ter também residência em terras mineiras) para acionar por lá o Judiciário contra o casal Antônio Neto e Fabrícia Farias.
E isso por uma razão muito evidente. E cruel. As custas judiciais aviltantes, surreais, imorais e inaceitáveis praticadas na Paraíba. Os números falam por si.
Em Minas Gerais, as custas judiciais da ação do super milionário, que cobra à Braiscompany R$ 5,6 milhões, totalizaram R$ 18.069,72. Na Paraíba, as custas judiciais de uma ação de R$ 300 mil movida contra a empresa do casal “Ais” somam exatamente R$ 20.252,50.
Para quem está desacostumado com a realidade da Justiça na Paraíba, é difícil explicar. Mas, é verdade. Aqui, uma ação judicial equivalente a pouco mais de 5% de uma ação judicial de classe semelhante em Minas custa ao cidadão 10% a mais.
MAIS POBRE PAGA MUITO MAIS
A aberração das custas judiciais da Paraíba, que encontra a complacência generalizada e o silêncio derrotado de todos os segmentos, evidencia-se ainda mais quando compara-se a riqueza entre os dois estados.
Minas Gerais, incomparavelmente mais rica, tem o 3º maior produto interno bruto do país, enquanto a Paraíba figura apenas na 19ª posição entre as 27 unidades da federação. O PIB daqui equivale a pouco mais de 10% do mineiro.
VICE DA VERGONHA
Mas, não se pense que a comparação entre Paraíba e Minas Gerais revela uma situação isolada. Na verdade, um levantamento do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) divulgado em 2019 confirmou uma realidade inaceitável.
A Justiça da Paraíba é a segunda mais cara do Brasil – a situação é pior somente no Piauí. Aliás, o balanço mostra que, no geral, os cidadãos dos estados mais pobres sofrem com o judiciário mais caro.
Naquele ano, o portal Migalhas (especializado na temática jurídica), fez a comparação das custas para um processo de R$ 100 mil (link reportagem aqui) e chegou ao seguinte resultado do total inicial a ser pago – devendo-se considerar que, de lá para cá, houve alterações nos valores absolutos médios por reajustes nas custas:
1º - Piauí (R$ 7.750,00)
2º - Paraíba (R$ 6.567,35)
3º - Maranhão (R$ 4.941,10)
4º - Bahia (R$ 4.659,84)
5º - Goiás (R$ 4.037,68)
6º - Amazonas (R$ 3.609,14)
7º - Sergipe (R$ 3.226,29)
8º - Ceará (R$ 3.089,58)
9º - Mato Grosso do Sul (R$ 2.994,21)
10° - Pará (R$ 2.993,93)
11º - Santa Catarina (R$ 2.800,00)
12º - Rio de Janeiro (R$ 2.768,80)
13º - Tocantins (R$ 2.601,00)
14º - Rio Grande do Sul (R$ 2.500,00)
15º - Mato Grosso (R$ 2.000,00)
16º - Pernambuco (R$ 1.954,13)
17º - Alagoas (R$ 1.809,03)
18º - Amapá (R$ 1.660,63)
19º - Roraima (R$ 1.528,66)
20º - Espírito Santo (R$ 1.523,80)
21º - Acre (R$ 1.500,00)
22º - Paraná (R$ 1.456,17)
23º - Minas Gerais (R$ 1.252,67)
24º - Rondônia (R$ 1.000,00)
25º - São Paulo (R$ 1.000,00)
26º - Rio Grande do Norte (R$ 708,55)
27º - Distrito Federal (R$ 550,58)
Como mostra o levantamento, enquanto um paraibano paga R$ 6.500 num processo de R$ 100 mil, um brasileiro de São Paulo, o Estado mais rico da federação, paga R$ 1.000.
NEGAR GRATUIDADE É REGRA
Embora o acesso gratuito à Justiça seja um princípio fundamental previsto na Constituição da República e reafirmado no Código de Processo Civil e na lei em geral, na prática, os juízes (sobretudo na Paraíba e principalmente em Campina Grande) tendem a negar o direito mesmo a cidadãos pobres.
E mesmo quando o paraibano obtém a gratuidade parcial ou total, é preciso enfrentar um trâmite que chega a ser constrangedor e indigno, expondo minúcias de suas finanças, sem previsão legal, exigidas pelos juízes.
Sem ter assegurado o direito que a Constituição prevê, na prática os menos abastados ficam sem acesso à Justiça.
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