Por Lenildo Ferreira | jornalista e advogado
Qual o objetivo alegado da chamada cota de gênero? Promover a maior participação feminina na política do Brasil. No entanto, sua aplicação atual, conforme entendimento que vai se sedimentando nos tribunais, mostra-se insustentável.
Que a cassação de mandatos como punição para casos de fraude da chamada cota de gênero é uma medida excessiva, injusta, desproporcional, sem razoabilidade – e, portanto, totalmente inconstitucional – é evidente, e já o dissemos.
Que esse tipo de sanção acaba ultrapassando a figura do culpado para punir inocentes, é óbvio.
Trata-se de uma pena que, ao invés de punir quem tem culpa, que são os dirigentes partidários envolvidos na fraude, ataca candidatos que não tiveram participação alguma nos atos.
Além disso, pune a multidão de cidadãos que têm seus votos cassados, mesmo tais votos tendo sido legítimos, sem qualquer vício que justificasse sustar a vontade soberana do eleitor.
BOA VENTURA: O RETRATO ACABADO DA INJUSTIÇA
No caso do município paraibano de Boa Ventura, que teve novas eleições para a Câmara de Vereadores neste domingo, o desastre da aplicação desse tipo de medida se expôs de uma forma escandalosa.
Uma mulher perdeu o mandato de vereadora, mesmo sem ter sido nem ela nem seu partido acusados de nada, e mesmo sem ter sequer podido se defender, por causa da chamada cota de gênero e sua aplicação inconstitucional.
Acontece que a Justiça Eleitoral cassou o registro (chamado DRAP) dos candidatos do partido em REP nas eleições do município porque a sigla teria usado candidaturas chamadas laranjas para atingir a cota de gênero.
Como haviam sido eleitos pela sigla 6 dos 9 vereadores da cidade, mais da metade dos votos foram anulados e, com isso, o TRE determinou novas eleições.
Livoneide Pinto, eleita pelo Solidariedade em 2020, não tinha nada a ver com as acusações que pesavam sobre o REP e seus seis eleitos. Mas, com a determinação de novas eleições, acabou também cassada.
Sem culpa alguma. Sem qualquer acusação. E, o pior, sequer tendo direito a ser ouvida no processo. Ou seja, sem defesa.
Resultado, na eleição de ontem, cinco dos seis vereadores do REP cassados conseguiram se eleger de novo.
Já Livoneide, mulher, eleita legitimamente, cujo partido não foi acusado de ferir a cota de gênero, está fora. E, repita-se, sem direito a se defender no processo.
Precisa ser jurista para ver o óbvio? Para ter certeza que isso é injusto, imoral, ilegal, inconstitucional e, portanto, inaceitável?
A militância ideológica, ao contaminar o direito e a Justiça destrói, a democracia.