As facções no Rio, na Paraíba e as eleições 2024 - Por Saulo Nunes


Nos idos de 2015-16, quando eu percorria, a trabalho, as vielas do bairro do Pedregal em Campina Grande para entregar intimações, fazer levantamentos e outras atividades inerentes à profissão, reservava alguns minutos (quando era possível) para refletir. Na maioria das vezes, éramos apenas eu e outro colega, sem coletes balísticos – porque estávamos descaracterizados –, perambulando pelas ruas e becos sangrentos daquela comunidade. Afinal, àquela época, duas gangues protagonizavam verdadeiras carnificinas na guerra pelo domínio local. Os conflitos resultavam em [muitas!] mortes, e lá estávamos nós para investigar cada vida ceifada pela violência.

Em uma das ‘caminhadas’ pelo bairro, vi-me apertado entre uma fila de casebres de um lado e um extenso canal correndo esgoto do outro. A viela por onde andávamos devia ter um metro e meio de largura e silhuetas bem irregulares, impossibilitando o tráfego de uma viatura, por exemplo. Andar ali só se fosse a pé, de moto ou a cavalo. 

Sobre o canal, alguns pedaços de madeira serviam de ‘pontes’ improvisadas para a passagem das pessoas que moravam do outro lado. O odor repugnante do ambiente só não era mais desolador do que ver crianças, descalças e de pouca roupa, passando pra lá e pra cá sobre a travessia balançante. Deviam ter entre cinco ou seis anos de idade, a mesma do meu primogênito que vivia – graças a Deus – uma situação bem diferente em casa.

Só que, sendo bem sincero, essa não era a preocupação principal do ‘policial humano’ que a sociedade civil organizada diz querer nas forças de segurança. O que me incomodava ali era saber onde se proteger de eventuais tiros quando as únicas opções disponíveis para uma dupla de investigadores eram uma fileira de casebres de um lado e um buraco fundo, comprido e cheio de esgoto do outro. Algum especialista em segurança pública tem uma dica aí? Mas tem que ser rápido. 

Rio de Janeiro

O jornal O Globo desta segunda-feira, 09/setembro, publica uma matéria sobre a expansão das facções criminosas do Rio de Janeiro para os demais estados. Um dos entrevistados, o secretário de segurança do Amazonas, Vinícius Almeida, disse que parte do território amazonense é “controlada” por chefes de facções que vivem escondidos em favelas do Rio de Janeiro. Foi essa circunstância, inclusive, que inspirou a manchete da reportagem: “Home office do crime”.

E entre as declarações ditas por Vinícius, uma me levou às vielas do Pedregal, nos idos de 2015-16.

“Segundo Almeida, a topografia, a ocupação desordenada e o grande poder bélico da facção no Rio dificultam a entrada das polícias na favela”, afirma O Globo, reproduzindo a fala do secretário. 

Eleições 2024

Uma rua/bairro/comunidade minimamente planejada não oferece apenas dignidade humana às pessoas que ali vivem. Contribuem, também, para o trabalho dos Correios, do SAMU, do IBGE... e da polícia. O inverso também é verdadeiro: quanto pior, pior.

Esses dias, talvez aquecido pela efervescência da campanha eleitoral vigente, ouvi um radialista paraibano dizer aos seus milhares de ouvintes que “prefeitura não tem nada a ver com segurança pública”. 

Então tá...

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